segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

À Procura (Parte 2)


7 da manhã. O despertador toca.

Você não está mais no quarto. Mas, tão cedo? Provavelmente está na cozinha, ou na sala. Vou ficar aqui e esperar você vir me acordar, dizer que vou perder a hora e provavelmente o trabalho se continuar atrasando todo dia, só pra sentir sua mão tocando meu rosto e seus braços me levantando da cama. Pelos pequenos raios de sol que passam pelas frestas da janela, imagino um dia sem nuvens lá fora.

10 minutos se passaram, você ainda não veio. Só pode estar no banho, ou vendo algo na internet, como sempre faz enquanto toma café. Fica ali, vendo fotos de lugares distantes e de paisagens bonitas. Você sempre diz que quer ir a todos aqueles campos, parques e florestas. Até acho bonito, mas, de flores, já bastam as do meu jardim, às quais costumo cuidar com zêlo. Ultimamente andam meio murchas. Não tenho tido tempo para elas como antigamente. Você sempre diz que preciso de mais tempo pra mim e para as minhas coisas, mas retruco dizendo que quem tem tempo demais acaba não sabendo aproveitar tempo algum.

7h15. Acho que vou levantar, pois provavelmente você está fazendo algo mais caprichado para o café da manhã e não teve tempo de me chamar. Estou tão disposta hoje! Talvez por ter dormido tão cedo ontem, logo após chegar do serviço. Nem vi a hora em que você veio deitar. Lembro-me apenas de te ver pensativo, à janela, com um olhar distante. Ultimamente, reparei que estava um tanto longe. Não perguntei nada, porque acho que logo vai passar. Sempre passa. Você sempre fica bem de novo.

7h30. Não posso esperar mais. Já estou atrasada. Você também. Por que não veio me acordar? Chego à cozinha e não há vestígios de você. Também não está na sala, nem no escritório, nem no banheiro. Seu carro está na garagem ainda. Estou confusa, onde você pode estar? Para onde foi sem mesmo comer alguma coisa? Suas roupas que separei para você usar hoje ainda estão no mesmo lugar. Não foi trabalhar?

Ligo em seu celular e não há resposta. Estou começando a me preocupar. Por favor, por favor... Aonde você foi? Por que está fazendo isso? O que tem em mente?

Passo novamente pela sala, disposta a pegar meu casaco e ir atrás de você. Contudo, algo me chamou a atenção... O computador está ligado! É mais uma de suas fotos, mais uma daquelas cidades longínquas com montanhas e trilhas bonitas que você já cansou de me mostrar.

Será que voc...


O barulho do celular tocando interrompe meus pensamentos.



(continua)

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

À Procura (Parte 1)

Esforço-me para não deixar pegadas. Não quero ser seguido. Não quero que me encontrem. 

O céu está tão bonito hoje! Posso ver as estrelas com facilidade. Hoje elas cobrem o céu quase por completo. É incrível como isso me faz sorrir sempre, não importa o que estou passando ou o que estou sentindo. À minha direita, o mar. Posso ouvir daqui o barulho das ondas quebrando na areia; o reflexo da lua tremula na água, agitada pelas brisas de verão que nessa noite se fazem presentes.

As luzes dos postes relevam minhas sombras, únicas companheiras de caminhada, que crescem e diminuem a cada passo que dou. Então, paro.

Hesito.

Uma gota quente percorre meu rosto e toca meus lábios. O gosto salgado me faz olhar pra trás, e parte de mim quer dar meia volta, quer largar a mochila no chão e correr pra você novamente. Volto minha visão bruscamente para frente. Não posso voltar mais. Não agora. Cerro meus punhos, fazendo meu máximo para enjaular meus sentimentos, a fim de não deixá-los explodir e tomarem conta de mim, levando-me a fazer exatamente o que minha razão suplica para que eu não faça.

Respiro fundo.
Acalmo-me, enfim.

Olho para as placas, que indicam que não estou tão longe do meu destino agora. As estrelas continuam no céu. As ondas do mar ainda ditam o ritmo dos passos e a brisa parece querer me empurrar para frente. Junto o que restou de mim e volto a caminhar, convicto a não deixar pistas.

Ironicamente, pistas foram tudo o que te deixei.


(continua)

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Learning to walk again


Damian costumava caminhar sozinho durante as noites de quarta-feira. Dizia que era o tempo que tinha separado para falar com ele mesmo durante a semana, só para acertar quaisquer mal-entendidos ou sentimentos distorcidos. Alguns o achavam louco por causa disso. “Sair pra falar consigo mesmo? Como pode?”, diziam.

Dias atrás, tentei imitá-lo. Saí sozinho, na intenção de filosofar sobre algumas pendências sentimentais que sempre deixava pra depois e acabava por não falar a ninguém. Depois de um tempo caminhando, já não conseguia mais me aturar! Percebi que reclamava muito, e que havia tanto a se vomitar, a arrancar de mim... Eu estava uma bagunça, tanto por dentro quanto por fora. Não sabia onde estava, quantas horas já haviam passado desde que comecei meu pequeno passeio solitário e por quantas vezes tive que parar para respirar fundo, olhar para o céu e segurar as lágrimas dentro de mim.

“Não vai ser fácil”, pensei. Voltei para casa, prometendo tentar de novo num futuro próximo. Colocar em minha frente tudo aquilo que quis esconder seria um exercício árduo, ainda mais se minha proposta era tentar refletir sobre as situações a fim de chegar a uma solução, ou mesmo uma simples conclusão.

Naquela mesma semana, tentei de novo. Dessa vez os pensamentos vieram mais claros, e as lágrimas também logo quiseram brotar. Percebi imediatamente que era tão egoísta comigo mesmo que nem me deixava chorar. Impunha-me muitas coisas, muitos modos, muitos meios. Ainda estava preocupado com o que os outros que passavam por mim pensariam. Então refleti: quando foi a última vez que eu fui eu mesmo, ou que um sorriso sincero saiu de mim, ou que minha voz proferiu exatamente o que queria falar? Estava na cara todo esse tempo e eu não tinha enxergado: não estava sendo dono de mim. Não estava me dando a atenção necessária, não estava sequer querendo me ouvir.

Sentei-me em um dos bancos de uma praça bem iluminada, sem muitas pessoas ao redor. Detive-me por instantes, mas resolvi: “Se me propus a falar, que ao menos eu me ouça.”
Ainda um pouco receoso com os arredores, comecei a falar. Primeiramente, fui quase inaudível, até que pude ouvir minha própria voz com clareza. Disse tudo o que quis, expus assuntos que me incomodavam, deixei as lágrimas saírem quando elas se represavam em meus olhos e até ri de erros bobos, que antes achava não tão bobos assim. As pessoas que passavam ficavam me encarando. Algumas riam, outras andavam mais rápido.

Devia mesmo parecer louco.

Horas se passaram, e quando me dei por mim o céu já clareava. “Realmente, havia muito a ser dito”. A noite passou despercebida. Voltando pra casa, senti-me inegavelmente mais leve. Funciona, então! Era possível que pouco mudasse a partir dali, mas já me sentia mais tranquilo por expelir tantos fantasmas que me acompanhavam. Dei-me muitos conselhos, ainda que, honestamente, não sabia se os seguiria. Ao menos algo em mim tinha parado de gritar, de empurrar, de me cansar.




Hoje é quarta de novo. E lá vai o Damian, com seu casaco, seu sorriso solto, seu olhar no infinito e seus cigarros no bolso.


De louco, ele não tem nada.